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Trabalho que apresenta o Teorema de Bayes como opção para a elaboração de um algoritmo capaz de auxiliar no reconhecimento, ou não, da autoria de textos manuscritos, com o uso das tabelas de frequência de construções exóticas apresentadas na pesquisa de Samuel Feuerharmel. Palavras Chave: Grafotécnico; Autoria; Algoritmo; Teorema de Bayes.

Isabel Leticia EGUÍA POÇO
Instituto de Criminalística – Superintendência da Polícia Técnico Científica do Estado de São Paulo - Brasil
Data de recepção e aceitação: 04 de abril de 2018


ABSTRACT: This paper presents the Bayes Theorem as an option to develop an algorithm capable of assisting in the determination, or not, of authorship of manuscript texts, using the frequency tables of exotic constructions presented in Samuel Feuerharmel's research. Key words: Manuscript texts; Authorship; Algorithm, Bayes Theorem.
ISABEL LETICIA EGUIA POÇO


I. INTRODUÇÃO

A necessidade de homogeneizar exames e opiniões periciais, que foi tema central do IX Congresso SIPDO realizado em Medellín, Colômbia, em 2016, pôs em evidência o problema que hoje se estabelece como ponto de partida deste trabalho. O reconhecimento da autoria de manuscritos é tema que desperta questões sobre a certeza do perito em determina-la. Estas dúvidas são usadas em tribunais com a intenção de desqualificar as conclusões, especialmente se é possível determinar, através delas a culpa do suspeito. Samuel Feuerharmel, Perito em Grafotecnia da Polícia Federal brasileira fez um estudo buscando o grau de incidência de determinadas formações estruturais das letras e números, encontrando o porcentual de tais construções, às que denominou “construções insólitas” ou incomuns; apesar de que seu trabalho se limita a informar tais incidências porcentuais, seu trabalho despertou um questionamento: será que é possível estabelecer um algoritmo ou equação estatística capaz de confirmar, com grau de certeza expresso percentualmente, nos moldes utilizados na identificação de DNA? Caso exista esta possibilidade, os relatórios de autoria de manuscritos ganhariam uma capa de cientificidade que se afasta de questões de interpretação do perito e eliminaria de nosso trabalho as críticas e dúvidas que muitas vezes são apresentadas por neófitos e pelos não familiarizados com os exames realizados. Buscando este resultado, propomos o uso de cálculos probabilísticos capazes de determinar, com grau de certeza superior a 99,99999%, a autoria gráfica de escritas. Devemos esclarecer, de forma clara, que lo que se propõe é a determinação de uma fórmula a ser aplicada (ou não) por cada perito, respeitadas as idiossincrasias de cada região e forma de escrita. Estamos conscientes de que cada região geográfica pode apresentar variações na forma de alfabetização das crianças e que este fator não nos permite generalizar as construções incomuns como sendo mundiais. O trabalho de encontrar as características especiais de cada país e a forma de escrever caberá aos estudiosos de cada área geográfica de acordo a suas próprias idiossincrasias e idiomas. O que este trabalho pretende, portanto, es apresentar os resultados encontrados no Brasil com relação às formas de construção dos grafismos e um possível algoritmo matemático que, antes de ser definitivo, pretende ser um primeiro passo na determinação inequívoca da autoria de manuscritos.

II. O PROBLEMA

A perícia grafotécnica se baseia na comparação dos elementos gráficos que são objeto de estudo e pode reger-se por diferentes metodologias, as que são utilizadas de acordo os princípios científicos adotados pelo país onde trabalha o perito. Assim, pode parecer que não há um método definido e/ou definitivo de exame, o que gera desconfianças em relação às decisões apresentadas aos tribunais. Na realidade, se observarmos atentamente cada método empregado na feitura de exames grafotécnicos, veremos que todos têm, por princípio, um cotejamento que busca estabelecer uma conexão positiva ou negativa entre o material indiscutível e o questionado. Assim, qualquer que seja o método empregado, seja Morfológico, Anastasiográfico, Escopométrico, Grafonômico, Morfométrico o gramatomórfico, Grafocinético, Grafométrico ou outro não citado, o que o perito faz é analisar detidamente as características individualizadoras da escrita, em seus traços gerais e particulares, com maior ênfase na construção dos grammas, ou seja, nos ataques, desenvolvimentos e arremates de cada lançamento. (Ros, 2014). Ao realizar os exames pertinentes a um caso concreto encontraremos semelhanças e diferenças entre os grafismos, o que nos leva, instintivamente e em razão do treinamento recebido, a separar mentalmente os elementos que nos serão úteis no exame daqueles que são indiferentes para a tomada de uma decisão. Esta separação se baseia, na maioria das vezes, no grau de variabilidade gráfica do punho do escritor, na percepção de uma tentativa de imitação e nos traços característicos e espontâneos, que quem escreve não consegue disfarçar. Em muitos momentos, ao realizar nosso trabalho, nos indagamos sobre as descobertas do estudo: Devemos listar as semelhanças e as diferenças para chegar a uma conclusão? Qual é o valor que devemos dar a cada uma delas? Qual é o critério que devemos empregar ao efetuar esta avaliação? Até que ponto a variabilidade gráfica interfere no resultado do exame? Quais são os elementos imutáveis e, portanto, identificadores da escrita? Estas questões nos trouxeram respostas que poderiam ser consideradas antagônicas apesar de não o serem: por um lado, de acordo com Heinrich Pfanne, citado por Llorente em sua tese de doutorado, “Se existirem diferenças que não se podem explicar, então as analogias, mesmo que valiosas, não deveriam ser consideradas” (Llorente, 2015) Por outro lado, como afirmado por Feuerharmel, ainda que sejam encontradas diferenças morfológicas ao largo de todo o manuscrito, a presença de construções gráficas consideradas “exóticas” permite estabelecer a autoria da escrita questionada. (Feuerharmel & Silva, 2014). Devemos esclarecer que, o que é denominado como construção exótica por Feuerharmel já havia sido definido por E. Locard como “idiotismos ou peculiaridades de execução, inimitáveis por ser inaparentes” (Llorente, 2015) Assim, vemos que são os traços particulares da escrita os que nos permitirão chegar a uma conclusão. Este cenário seria maravilhoso se todos os indivíduos tivessem um elemento identificador único e personalíssimo em sua forma de escrever. Não é assim.


 

III. A PESQUISA DE SAMUEL FEUERHARMEL

O perito em Grafotecnia da Polícia Federal brasileira fez um trabalho buscando o grau de incidência de determinadas formações estruturais de letras e números, no estudo que se resume a seguir:
Foram tomados 321 (trezentos e vinte e um) grafismos de indivíduos adultos, com grau de instrução superior em diversas áreas, os quais estavam cursando pós-graduação em Perícia Judicial. Os pesquisados, que não se identificaram durante a tomada dos grafismos, fizeram lançamentos isolados de números e de algumas letras de forma (imprensa) maiúsculas, sem que tivessem conhecimento do uso que tais escritas teriam, apesar dos estudos realizados por Feuerharmel terem como escopo a determinação de autoria de manuscritos a partir da acentuação gráfica e da forma de construção de dígitos e letras, cuja conclusão foi apresentada na Revista nº 37 da APCF – Associação dos Peritos Criminais Federais. Os resultados da pesquisa analisam a formação dos números de 0 a 9 e das letras A, E, F, H, I, O, P e duas formas de construção da letra T, agrupando-os como demonstrado abaixo. O estudo, que se limitou à análise dessas letras, procurou nelas, principalmente, o sentido da escrita dos traços verticais e/ou horizontais. O resultado, como apresentado, já indica os porcentuais dos métodos de formação de cada dígito em suas diferentes formas de construção, além de como será identificado esse método de construção na tabela de frequências.

 Associação Grafo Brasil


Figura 1 - Construção dos números "0", "1", "2" y "3", os que apresentam somente duas formas (A e B) basicas de construção. (Feuerhamel, 2016)

 Associação Grafo Brasil 1


Figura 2 - Construção do número "4", pois apresentou oito formas de construção, (A, B, C, D, E, F, G e H) (Feuerhamel, 2016)

Associação Grafo Brasil 2
Figura 3 - Construção do número "5", que apresentou quatro formas de construção, (A, B, C e D) (Feuerhamel, 2016)

Associação Grafo Brasil 3
Figura 4 - Construção do número "6", que apresentou duas formas de construção, (A e B) (Feuerhamel, 2016)

 Associação Grafo Brasil 4


Figura 5 - Construção do número "7", que apresentou quatro formas de construção, (A, B, C, D e E) (Feuerhamel, 2016)

Associação Grafo Brasil 5

Figura 6 - Construção do número "8", que apresentou três formas de construção, sendo uma em sentido anti-horário, uma em sentido horário e uma formada por dois círculos superpostos, sendo que esta última forma foi desprezada (Feuerhamel, 2016)

Associação Grafo Brasil 6


Figura 7 - Construção do número "9", que apresentou quatro formas de construção, (A, B, C e D) (Feuerhamel, 2016)
As imagens acima permitem criar uma tabela com as frequências obtidas, observando que a cada formação corresponde uma letra que a identificará daqui por diante.

Associação Grafo Brasil 7

Tabela 1 - Frequências observadas quanto ao método de construção dos dígitos estudados (n=127 para o "8" e 160 para os demais). Os métodos de construção indicados por letras nesta tabela estão representados nas figuras 1 a 7 (Feuerhamel, 2016). Quando se trata do número “0” foi observado no sentido do traçado horario, que o local do ponto de ataque apresentou uma frequência de 96,9%, o que gerou uma sub distribuição de frequência como pode ser observado abaixo:

Associação Grafo Brasil 10

Figura 8 – Subclassificação das frequências de ataque na formação do número "0" quando escrito em sentido horário (Feuerhamel, 2016). A exemplo do que foi feito com os números, as letras de imprensa maiúsculas escolhidas para estudo tiveram sua frequência de construção de alógrafos estabelecida, conforme se mostra abaixo.

Associação Grafo Brasil 9


Figura 9 - Alógrafos das letras A, E e F, cada um apresentando duas formas básicas de construção possíveis. (Feuerhamel, 2016)

Associação Grafo Brasil 8
Figura 10 - Alógrafos das letras H, I e O, cada uma apresentando duas formas básicas de construção possíveis. (Feuerhamel, 2016)

Associação Grafo Brasil 12

Figura 11 - Alógrafos das letras P e T. As formas de construção da letra T consideram se o instrumento escritor foi levantado ou não. (Feuerhamel, 2016)

Associação Grafo Brasil 11

Figura 12 - Frequências dos alógrafos das letras estudadas

Os resultados da pesquisa de Feuerharmel, a qual foi direcionada para a possibilidade de estabelecer, ou não, a autoria de manuscritos a partir de sinais de acentuação e números de construção exótica, foram publicados na revista da APCF e apresentados no XIV Seminário de Documentologia realizado em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, em 2016.

 


IV. UMA POSSÍVEL RESPOSTA AO PROBLEMA SUSCITADO

A necessidade de estabelecer critérios e de conseguir uma homogeneização nos resultados dos exames grafotécnicos, nos levaram a buscar novos caminhos sem abandonar os métodos já consagrados e amplamente utilizados pelos peritos em grafotecnia. Assim, o estudo realizado por Feuerharmel, apesar de efetuado com um objetivo diverso do aqui estabelecido, nos levaram a indagar sobre a possibilidade de encontrar um algoritmo que permita estabelecer, com certo grau de confiança, a autoria ou a negação de autoria de um manuscrito questionado. A partir dos estudos de Feuerharmel, que foram capazes de determinar a frequência em que uma determinada característica gráfica ocorre em uma dada população, buscamos na Estatística e nas teorias probabilísticas a solução do problema apresentado. As pesquisas realizadas nos permitiram concluir que o melhor teorema a ser utilizado neste problema é o Teorema de Bayes, resultado imediato da regra do produto de probabilidades. A teoria Bayesiana leva em conta que nosso conhecimento do mundo é imperfeito e que tanto o ruído contido nos dados de nossos estudos como os pré-conceitos de certeza que têm origem em nossa subjetividade, podem levar-nos a erros, transformando assim as principais críticas que esta teoria recebe em fator importante na solução de problemas. Apenas o fato de reconhecer que a subjetividade não pode ser eliminada e que todos temos conceitos preconcebidos, leva a melhores resultados que intentar esconder esta subjetividade com afirmações pseudo-objetivas. (Bachega, 2016). O que necessitamos é saber separar o sinal do ruído, para que a aplicação do teorema de Bayes possa trazer-nos êxito.

V. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS BACHEGA, R.R. (05 de Junho de 2016). Fonte: Universo Racionalista: https://universoracionalista.org/oque-e-a-regra-de-bayes/ BONILHA, C. H: Tratado de Documentologia. 1a Ed. 1a reimp. CABA, La Roca, 2014. DEL PICCHIA FILHO, J.: Tratado de Documentoscopia: “da falsidade documental”. 3a Ed. rev., ampl. e atual., São Paulo: Ed. Pilares, 2016. FEUERHAMEL, S. (Julho de 2016). Métodos de Construção exóticos em algarismos e sinais de acentuação. APCF – Associação dos Peritos Criminais Federais, 37, 13-18 FEUERHAMEL, S. & SILVA, E. Documentoscopia: Aspectos Científicos, Técnicos e Jurídicos. Campinas: Millennium Editora, 2014. LLORENTE, M.A. (Abril de 2015) Obtido de https://ddd.uab.cat/pub/tesis/2015/hdl_10803_315287/marl.pdf MENDES, L. B.: Documentoscopia. 2a Ed. Campinas, SP, Millennium Editora, 2003. P. – (Tratado de pericias criminalísticas; v.7) ROS, B. L. (agosto de 2014). Fonte: biblio3.url.edu.gt/Tesario/2014/07/03/Rojas-Baldomero.pdf VELASQUEZ POSADA, L. G: Falsidade Documental y Laboratório Forense. 1a Ed. 1a reimp. Buenos Aires